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O QUE VEM A SER A IGREJA CONCILIAR

Feliz culpa de Adão, que nos mereceu um tal e tão grande Salvador!

Deus só permite o mal para daí tirar um bem maior. Ele permitiu o pecado de Adão, para daí tirar o bem infinitamente maior da Encarnação e da Redenção. E, em consequência da Encarnação e da Redenção, constituiu a Santa Igreja.

A Santa Igreja é o meio, que Deus instituiu, através do qual os homens devem participar da vida divina, primeiramente na obscuridade da Fé e depois na visão, no gozo e na posse de Deus. Essa é a finalidade para a qual foram criados todos os homens, finalidade cheia de amor (e que amor! Amor incrível! Infinito!) por cada um de nós. E não temos o direito de não querer esse dom inestimável. Seremos justamente castigados se o recusarmos.

Poderíamos pensar que o nosso bem é o que queremos para nós. Mas nosso Pai, nosso bom Pai, nosso melhor Amigo, Aquele que se fez nosso irmão e até quer ser nosso Filho, Ele sabe que, muitíssimas vezes, o que queremos é péssimo para nós. Como alguém que tenha um filho ou um irmão ou uma mãe que não querem absolutamente vê-lo bêbado porque sabem que isso é um mal para ele. Mas ele acha que isso é bom: como ele gosta de beber até a embriaguez!… “Por que essas pessoas, que deveriam me querer bem, ficam me reprovando de fazer o que tanto gosto?” Porque sabem que isso não é bom. Assim Deus para conosco.

Conclusão, todo homem deve pertencer à Santa Igreja para se salvar. E só se pode pertencer à Santa Igreja por causa de Nosso Senhor Jesus Cristo. Foi porque Ele morreu por nós é que cada um de nós pode receber a participação de Sua vida divina, pela graça santificante.

A Igreja Católica define-se com mais propriedade como sendo o Corpo Místico de Cristo. E nesse corpo, Nosso Senhor Jesus Cristo é a cabeça e todos os mais que pertencem a esse mesmo corpo (inclusive o Papa) são seus membros.

Dessa Cabeça divina desce a graça santificante a seus membros. E essa graça é para todos os homens (ainda que nem todos a recebam), desde Adão até o último homem que existir. Portanto, mesmo os homens do Antigo Testamento que tiveram a dita de recebê-la, receberam-na por Nosso Senhor Jesus Cristo, e pertenciam à Igreja Católica. E se alguém, por acaso, se salva com o batismo de desejo, pertencendo externamente a uma falsa religião, na verdade pertence à Igreja Católica, mesmo sem o saber.

Vimos uma primeira distinção em partes, que se pode fazer na Igreja: uma parte é a Cabeça, e a outra os membros. Mas a Igreja é uma realidade complexa, acerca da qual precisamos fazer várias outras distinções para poder bem compreendê-la. Com efeito, sob um outro aspecto, o do lugar onde se encontram os seus membros, podemos distinguir a Igreja triunfante (composta por aqueles que estão no Céu), a Igreja padecente (composta por aqueles que estão no Purgatório) e a Igreja militante (composta por aqueles que estão na Terra). Ainda, sob o aspecto da guarda e da transmissão da Revelação, faz-se a distinção entre a Igreja docente (a que ensina: o Papa e os Bispos) e a Igreja discente (a que é ensinada: os demais membros). Mais outro aspecto: a Igreja, que é comparada a um homem, tem um corpo e uma alma. E nesse corpo podemos distinguir seus membros vivos e seus membros mortos. Os vivos são os que estão recebendo, da Cabeça, a vida sobrenatural da graça santificante. Os mortos são os que não estão recebendo essa vida. São como os membros gangrenados de uma pessoa: esses membros pertencem ao corpo aparentemente, materialmente, mas não formalmente, pois o sangue não os irriga mais; neles não está mais a vida do corpo.

Como vimos, a Santa Igreja tem um corpo e uma alma. Em que consiste o seu corpo? No culto (parte externa dos Sacramentos, da Santa Missa etc.), no governo (postos hierárquicos), no ensino, nas pessoas batizadas. E em que consiste sua alma? São as virtudes sobrenaturais (teologais e morais), os dons do Espírito Santo, o depósito das verdades reveladas (morais e dogmáticas), as graças santificante e atuais, que nos vêm ordinariamente pelos Sacramentos.

A Igreja Católica é Santa. É um erro dizer que ela é santa e pecadora. No entanto, é um fato que muitos de seus membros são pecadores. Portanto, o que inalienavelmente é santo é a alma da Igreja, onde não há ruga nem mancha. Assim como, por sinédoque, chamamos os homens de almas (“nesta paróquia há tantas almas”), dando ao todo o nome da parte principal. A alma da Igreja é o que há de principal na Igreja e na qual não pode haver pecado nem erro algum. Na medida em que o corpo da Igreja está em conformidade com a santidade de sua alma, ele, o corpo, é santo. Se o que é realizado nesse corpo é conduzido, ordenado, direcionado por sua alma, de acordo com sua doutrina dogmática (inteligência) e moral (vontade), isso é católico e divino, caso contrário, é humano e falível.

Demos um exemplo à guisa de comparação: se um sonâmbulo pular de um lugar alto e morrer com a queda, não se lhe pode imputar esse ato como um suicídio, porque a pessoa que age no sono age sem o uso da razão (inteligência e vontade) e, portanto, sem culpa, podendo-se dizer que não foi a pessoa que agiu: foi o seu corpo sem estar sob o império da alma (cujas duas potências são a inteligência e a vontade)

Deve-se observar que entre os pecados que pode haver nos membros do corpo da Igreja, encontra-se a heresia: pecado contra a Fé. Esse pecado, nos bons tempos, levava à exclusão desse membro, por um decreto da hierarquia; mas enquanto esse decreto não é feito, o dito membro continua a ser membro da Igreja (membro morto se a heresia é formal, membro vivo se a heresia é somente material).

A Igreja Católica é Una. Essa unidade é requerida porque a verdade se opõe à falsidade. Uma diferença (de culto, por exemplo, entre os orientais) que não inclui uma falsidade não requer uma diversidade de igrejas.

A Igreja (com maiúscula) é a Igreja Católica. Ela é a Igreja, por antonomásia. É o protótipo, aquela em que se realiza plenamente o significado dessa palavra (a qual vem do latim ecclesia, que quer dizer reunião, com motivo religioso, organizada, com finalidade religiosa). É a reunião por excelência: a melhor de todas e que todas devem considerar como modelo. Assim, por exemplo,  acontece com a palavra bíblia (que quer dizer: o livro): isso não porque os outros livros não sejam livros, mas porque a Bíblia é o livro por excelência.

O mesmo não se pode dizer da palavra religião, a qual só se aplica verdadeiramente ao Catolicismo, pois ela significa religar, ligar novamente o que estava separado; e o que se trata aqui é de religar o homem com Deus, os quais haviam sido separados pelo pecado, tanto o de Adão como os nossos. Ora, só a Igreja fundada pelo mesmo Deus é depositária do Sacrifício Redentor que realizou a obra de reunir o que havia sido separado. Portanto, é um uso indevido aplicar às outras “igrejas” o nome de religião, pois não religam nada.

Diante do que foi dito, vamos considerar a expressão “Igreja Conciliar”. Ela foi empregada pelo Cardeal Beneli. Dom Lefebvre, já em 1976, havia denunciado a existência de uma outra “igreja” no seio da Santa Igreja. Afirmação, portanto, não causada por uma emoção passageira por ocasião das sagrações episcopais de 1988 (como, parece, está-se pensando entre aqueles que, na “Tradição”, não querem acreditar na existência dessa outra “igreja”, pois agora eles têm em vista um “acordo” ou “entendimento” ou “reconhecimento” ou “oficialização” ou qualquer outro nome que queiram dar à mesma realidade). De seu lado, também Gustavo Corção já falava na “outra”, referindo-se à mesma infiltrada “igreja”.

No decurso dos séculos, Deus permitiu as heresias; e um grande bem que Ele tirou desse mal foi a explicitação da doutrina já crida na Igreja. Creio que, semelhantemente, podemos aplicar isso à realidade da “Igreja Conciliar”. Dom Lefebvre e Corção afirmaram a real existência de uma “igreja parasita”, sem descer a detalhes sobre no quê ela consistia. Depois, procurou-se explicar essa realidade com comparações: moedas, câncer, “amante” etc.. Mas, como “toda comparação claudica”, fazia-se mister uma explicação mais precisa. Julgo haver sido encontrada na exposição feita em um artigo da revista Le Sel de la Terre (revista que, aliás, aconselho nossos leitores a assinarem), cujo autor cuidou em não se identificar (provavelmente para não ser “punido”) e que parece haver encontrado o verdadeiro significado dessa Igreja Conciliar: é uma seita, uma reunião de pessoas que têm uma doutrina “religiosa” diferente da da Santa Igreja, organizada, com a finalidade de “reformar” essa mesma Santa Igreja por dentro, sem sair dela, tomando os seus postos de comando.

Então, essa “igreja” se encontra dentro da Igreja Católica, mas é distinta dela. E os membros dessa seita, tendo nas mãos os postos de comando da Santa Igreja, impõem a sua “organização eclesial”, para os católicos se submeterem a ela. Daí vêm a Nova Missa, o novo Catecismo, o novo Magistério, o novo Código de Direito Canônico, os novos Sacramentos… Não foi a Santa Igreja que decretou a Nova Missa, não foi a Santa Igreja que decretou o novo Catecismo, não foi a Santa Igreja que decretou o novo Código de Direito Canônico, não foi a Santa Igreja que decretou os novos Sacramentos. Foi um homem que ocupa o mais alto grau da hierarquia católica, mas que pertence à dita seita ao mesmo tempo que pertence ao corpo da Santa Igreja, pois é batizado, e talvez até mesmo pertença à alma da Igreja (só Deus sabe), pois o modernismo estraga de tal modo as cabeças, que é possível haver verdadeira Fé (interior) junto com erros doutrinais.

O novo Magistério não é o Magistério da Santa Igreja, ainda que tenha coisas verdadeiras, mas misturadas com falsas. Assim, as diversas doutrinas dos diversos hereges são falsas, ainda que tenham coisas verdadeiras, pois estas estão misturadas com falsas. A Igreja só tem o direito (e o dever) de transmitir o depósito revelado, no qual, evidentemente, não há erro algum.

Conclusão: submeter-se ao Catecismo tradicional, ao Magistério tradicional, ao Código de Direito Canônico anterior ao novo, aos Sacramentos tradicionais, à Missa de sempre, é submeter-se à Santa Igreja e à hierarquia da Santa Igreja, é submeter-se ao Papa e ao episcopado católicos. Pois quando, por uma imperscrutável permissão divina, ocorre de o Papa e os bispos pertencerem a uma seita (ainda que verdadeiro Papa e verdadeiros bispos, que ocupam verdadeiros postos na hierarquia católica), eles passam a não ser mais referência para os católicos, os quais devem referir-se aos Papas anteriores a essa situação anormal, e aos bispos que ainda hoje se opõem a essa situação.

O que está ocorrendo atualmente na Igreja é dramático. Nossa atitude pode ser mesmo apavorante para alguém que não mediu a profundidade do problema. Mas é um fato. As coisas são o que são, e não podemos “tapar o sol com a peneira”. Queira Deus que Ele continue a ter misericórdia de nós, mostrando às pessoas, como tem feito frequentemente, quão verdadeiro é o nosso modo de encarar essa fase da história da Igreja, pela qual passamos. Que Maria Santíssima não nos abandone e nos faça perseverar na fidelidade à Igreja de Seu Divino Filho.

Arsenius

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