top of page

XIX – O Serviço de Deus - Necessidade de servir



“Os dois caminhos” – Contam os antigos que o famoso Hércules (herói da mitologia grega), quando era rapazinho teve esta visão. Parecia-lhe achar-se numa encruzilhada, de onde partiam dois caminhos. Um desses caminhos era largo, plano e florido; e no fundo deste havia um jovem de olhar atrevido, de vestes pomposas, de cabelos perfumados e coroados de rosas, o qual o chamava com mil carícias. “Quem és tu?”, indagou Hércules. E ele: “Eu sou o Prazer”. O outro caminho, no entanto, era estreito, desigual, pedregoso e espinhoso; e no princípio dele havia uma mulher séria, modestamente vestida e de olhar suave, que lhe dizia: “Vem a mim: eu sou a Virtude”. Hércules ficou tão empolgado com esta, que virou logo as costas para o Prazer e se meteu pelo caminho estreito e espinhoso, a fim de seguir a Virtude. Assim se torna um herói.


***


Com essa lenda, os antigos (embora pagãos) queriam fazer compreender que os jovens não devem ir pelo caminho do prazer e do vício, mas devem seguir a virtude, se bem que esta se mostre difícil e dura. Assim adquirirão grandeza e fama perante Deus e os homens.

Ora, também a vós, queridos jovens, no início de vossa vida, apresentar-se-ão dois caminhos diferentes: o do bem, ou do serviço de Deus; e o do mal, ou serviço do demônio. Far-vos-ei agora conhecer esses dois caminhos, assim compreendereis.


I – Necessidade de servir a Deus


1 – É um dever


Servir a Deus é um dever para todo mundo. Não é Deus o nosso Senhor absoluto? Não é o nosso Criador, Conservador, Pai, Remunerador? Seria um rebelde e um insensato quem se recusasse a servir a Ele. Quando os israelitas, murmurando, tentaram subtrair-se ao serviço de Deus, ele lhes disse: “Conhecereis que Eu Sou o Senhor Deus vosso” (Ex 16,12). Deus nos fez o mandamento de servi-Lo: “Adorarás o Senhor teu Deus, e a Ele somente servirás” (Dt 6,13; Mt 4,10).


Se O servem todas as criaturas até irracionais, por que não deverá servi-Lo o homem? E todo mundo deveria procurar a honra de servir a um Rei tão grande. Não vedes como se consideram honrados os homens por servirem aos reis da terra? E não deve ser para nós maior honra o servir ao rei do Céu?


2 – É um dever até para os jovens


Dentre estes, alguns se julgam isentos do serviço de Deus, justamente porque são jovens, e dizem: “Agora queremos divertir-nos; quando estivermos velhos serviremos a Deus também. Deus é um senhor: esperar-nos-á para hora mais tardia e acolher-nos-á do mesmo modo”. Então porque se é moço não se é obrigado a observar a lei de Deus? E os Mandamentos de Deus, serão feitos só para os velhos? Ouvi, no entanto, o que vos diz o Senhor: “Lembrai-vos do vosso Criador nos dias da tua mocidade” (Ecl 12,1). E depois acrescenta: “Boa coisa é para o homem o ter suportado o jugo desde sua adolescência” (Jer 2, 27). Portanto, os jovens são obrigados tanto como os velhos, e até mais do que estes, ao serviço de Deus. A Deus se deve dar sempre as primícias.


3 – Quem está afinal seguro de durar muito?


Não sabeis que a morte não olha a cara de ninguém, e passa a sua foice em cima dos mocinhos? Quantos morrem quando estão apenas no limiar da vida? Suponhamos, porém, que Deus vos espere, e que tenhais de ficar velho, até como Matusalém. Será, então, verdade que afinal vos entregareis ao serviço de Deus? O Senhor é bom, sim, e acolhe a todos; mas, vede, há uma dificuldade! Sabeis qual? Ei-la:


4 – Quem desde moço não serve o Senhor


Quem desde moço não serve o Senhor, nem quando velho servi-Lo-á, e verificar-se-á o que diz o Espírito Santo: “Seus ossos impregnar-se-ão dos vícios de sua mocidade, e com ele dormirão no pó” (Jó 20,11). Eis a bela vida e os belos milagres que farão aqueles que não querem dar sua mocidade a Deus: andarão como cegos que caminham pela montanha, onde aqui há um precipício, ali uma passagem perigosa, acolá uma mata escura; e acabarão quebrando a cabeça e perdendo-se. Surgirão neles todas as paixões: e aí perderão o amor e o respeito aos pais; perderão a confiança perante os verdadeiros amigos; deixarão todas as práticas religiosas; perderão o pudor, e por fim, a fé. Cheio de vícios, não respeitarão mais as festas; não farão mais a Páscoa; não ouvirão mais a Missa. Em suma, tornar-se-ão como os animais, e irão à eterna perdição.


Tais são os milagres de quem não quer dar a Deus a bela idade da juventude, que obteve d'Ele. Por isso diz o Espírito Santo: “O que não ajuntaste na tua mocidade, como acharás na tua velhice?” (Eclo 25, 5). Porque é um fato que infelizmente se verifica, esse de que nos adverte ainda o Espírito Santo, isto é: “O jovem, uma vez tomado o seu caminho, deste não se afastará nem quando estiver envelhecido” (Prov 22,6).


5 – A Deus os restos?


Suponhamos ainda que vos convertais quando velhos; e que, então, vos entregareis ao serviço de Deus. Mas vos parece que o Senhor, tão bom e generoso, mereça de vós somente os restos? Ou não merece antes ser por vós servido com generosidade desde os primeiros anos?


“A Deus a borra?” – Nas Atas da Ordem Cisterciense, se lê de um homem rico, que foi escravo do mundo grande parte da sua vida. Na mocidade costumava ele dizer: “Oh! Que bom estar no mundo! Aqui tenho todas as comodidades: dinheiro, criados, boa mesa... Cá estamos alegremente, e fazemos carnaval todo o ano!”. Chegando a maturidade, lembrou-se de que há outro mundo, onde seremos felizes ou infelizes para sempre. Aí pensou em dedicar-se inteiramente ao serviço de Deus e se fez religioso. Mas no início de sua conversão ele se tomou de uma grande vergonha e confusão, e ouvia uma voz íntima que lhe dizia: “Oh! Que belo servo de Deus és tu! Que bela renúncia fizestes ao mundo, hein? Dás a Deus a casca do limão, depois de teres espremido a gozar no mundo. Ao mundo e aos demônios deste a flor do vinho, e a Deus dás a borra do vinho prensado. Oh! Que bela dádiva! Vestiste de frade um corpo que fede a sepultura! Que queres que Deus faça deste traço de vida?”. Com estas reflexões, aquele pobre convertido estava quase a pique de se desesperar.


6 – Fazer a metade com Deus e com o mundo


Há, afinal, uns jovens que gostariam de contentar a Deus e ao mesmo tempo contentar a si mesmo, o seu amor-próprio, as suas paixões. Mas, pode-se fazer isso? Pode-se pretender servir a dois senhores que são entre si tão opostos e inimigos, como sejam Deus e o demônio? E, no entanto, tais jovens se creem ir por um bom caminho. Dizem eles: Façamos um pouco de tudo; façamos o mal, porém façamos também o bem; falemos mentiras e blasfêmias, mas também as orações; desobedeçamos aos pais, mas vamos também à igreja; pratiquemos furtos, mas também alguma esmola; cometamos certas feiuras, mas vamos também confessar-nos e façamos penitência... Assim, quando prestarmos contas a Deus, estaremos par a par”.


Esse é o maior erro dos cegos que vão por um caminho falso. Escutai o que diz o Senhor: “Há um caminho que ao homem parece reto: mas o seu fim leva à morte” (Prov 14,12). E acrescenta claramente que “ninguém pode servir a dois senhores; porque ou odiará um e amará o outro, ou então afeiçoar-se-á ao primeiro e desprezará o segundo” (Mt 6, 24). Há mesmo provérbios antigos e novos, que falam como é impossível fazer ao mesmo tempo duas coisas diversas. Um certo Plautilo queria que seu servo fizesse muita coisa ao mesmo tempo; e o servo lhe respondeu: “Mas senhor patrão, para falar como penso, tomar uma bebida quente e ao mesmo tempo soprá-la não se pode. Assim diz Plauto numa de suas comédias. Outro disse:


“Quem ao mesmo tempo duas lebres quer caçar,

Uma não pega, e a outra deixa andar”.


E nós dizemos que “não se pode ter o pé em dois estribos”.


Que significa, então, servir a dois senhores? Significa negar a Deus o serviço a ele devido, pois quem não está com ele, é contra ele. Disse-o Jesus Cristo no Evangelho: “Quem não está comigo é contra mim; e quem não colhe comigo, desperdiça” (Lc 11, 23). E ainda disse o Espírito Santo: “O coração que entra por dois caminhos, não será bem sucedido” (Eclo 3, 28).


(Extraído do livro A Palavra de Deus em Exemplos, G. Montarino,

Do original La Parole di Dio per la Via d’Esempi)

*Os artigos publicados de autoria de terceiros não refletem necessariamente a opinião do Mosteiro da Santa Cruz e sua publicação atêm-se apenas a seu caráter informativo.

É proibida a reprodução total ou parcial de textos, fotos, ilustrações ou qualquer outro conteúdo deste site por qualquer meio sem a prévia autorização de seu autor/criador ou do administrador, conforme LEI Nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.

bottom of page