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A Igreja na França


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Por Gustavo Corção publicado n’O Globo em 24 de abril de 1971.


QUARENTA anos atrás começava, ou melhor, ganhava corpo na França, a torrente revolucionária da esquerda católica. Pode-se dizer sem exagero que foi lá, desde o princípio do século, que começou ISTO que hoje nos enche de estupefação e tristeza. Estou terminando um livro onde procuro mostrar as várias correntes, as várias linhas-de-história que compõem o fenômeno que o Papa Paulo VI, num grito de angústia, chamou de Autodestruição da Igreja, e onde procuro evidenciar o triste, o diabólico papel da esquerda católica francesa, que aproveitou como pôde a infortunada crise da Action Française.


HOJE podemos afiançar que está ainda na França o maior volume de apostasia e de revolta, a maior força de depravação e de corrupção da Fé; mas também — louvado seja Deus! é ainda na Franca, sempre viva e sempre católica, que se encontra a mais vigorosa, a mais ortodoxa, a mais inteligente e organizada defesa da Fé.


COMECEMOS pelo pior. A crise religiosa na França, que exuma e amplifica todos os erros do "modernismo" combatido por Pio X, agrava-se com a adulterina ligação que entretém com a revolução anarquista e marxista. Mas o aspecto mais grave da crise religiosa na Franca consiste na conivência e até na iniciativa de um episcopado que quer ser mais jovem e mais anárquico do que os padres contestários. Colhemos alguns exemplos de decomposição da Fé enumerados pelo Pe. Louis Coache:


a) Os novos métodos catequistas com suas "fichas catequéticas" que aconselham a não falar em Deus nos primeiros meses!


b) O Batismo é um sinal que faz a pessoa tomar consciência da vida de filho de Deus; Na Eucaristia "os fiéis exprimem sua Fé a fim de que o Cristo esteja presente para eles"; o sacramento da Penitência é "sinal de reconciliação para aqueles que sentem a necessidade".


O MODERNISMO de 1970 é na realidade muito mais funesto que o do princípio do século, é mais profundo, mais extenso, agravado pelo conúbio com o marxismo, e superagravado com a promoção que lhe dão os bispos de França.


"O OBJETIVO da Nova Igreja é o de tudo destruir; e já não sobra muita coisa intacta. Querem uma religião do homem, uma liturgia deísta a caminho de se tornar ateia (...) As instituições são assaltadas, seminários, conventos, congregações, tudo desmorona. Todo um patrimônio maravilhoso de vida religiosa e mística na presença de Deus tende a desaparecer. Eles só creem na presença do Mundo. E nossos bispos (na França) impassíveis ou entusiastas permitem tudo quando não são eles mesmos que promovem a demolição."


EXEMPLOS de atos da Anti-Igreja de França comandada pelos seus Bispos:

a) Advertência grave do Santo Ofício contra Teilhard em 1963. Os Bispos de França não movem um dedo para deter a maior onda publicitária do século.


b) Encíclica Humanae Vitae. A Nota Pastoral dos bispos em Lourdes admite como lícito o que o Papa denuncia como expressamente proibido.


c) Instrução pontifícia de 28 de maio de 69 sobre a Comunhão na boca. Na prática veem-se todos os abusos com o consentimento dos Bispos, E em alguns casos são eles que incentivam a comunhão na mão.


EM RESUMO, a lei é transgredida a cada instante, a moral é desprezada e ridicularizada, o tesouro da Revolução é dilapidado. E a Conferência dos Bispos, que aliás não tem jurisdição canônica, impõe aos fiéis e aos padres o contrário do pensamento e da vontade da Santa Sé, pretendendo hipocritamente "interpretar" ou "precisar": e todo o mundo se inclina em nome da obediência.


E AINDA há quem diga que tudo vai bem, que as renovações são admiráveis "apesar de alguns excessos".


MAS nesse meio tempo desaparecem os seminários, ou são substituídos pelo que nós aqui chamaríamos de "aparelhos". Num constrangido e tímido depoimento (La Croix 13 de março de 1970), o Cardeal Danielou diz seu "desgôste de ver os jovens entrarem cheios de fé e saírem com uma fé vacilante, abalada ou destruída pela formação recebida". Há 25 anos o Bispo de Vannes ordenava cerca de 40 padres por ano em seu seminário Hoje: zero.


A PARÓQUIA também desaparece e é substituída por "equipes". Na revista Pelerin (tiragem de 500 mil!), o Pe. Gallay diz: "No que concerne ressurreição imediata depois da morte, penso que é óbvia... Para existir depois da morte o homem precisa de uma corporeidade qualquer, isto é, de um corpo espiritual que, por ser espiritual, não é menos real. Com efeito, um espirito humano sem um lugar, sem um corpo para se exprimir, é ideia derivada de um dualismo escolástico empobrecedor..."


ESSE padre nega ostensivamente a doutrina católica em favor de uma espécie de espiritismo, que é um materialismo vaporizado. E esta brutal ofensa à Igreja é feita para 500 mil leitores. Os bispos não deram nenhum sinal de aflição. Na Rádio Luxemburgo o Pe. Jossua, professor do Saulchoir, negou a existência da graça, e riu-se da doutrina clássica. A hierarquia não se abalou.


* * *


E AGORA ponderemos uma coisa: é nessa parte corrompida do catolicismo francês que mais se multiplicam os ataques feitos ao Brasil. Essa campanha difamadora, para a qual leigos, padres e arcebispos brasileiros emprestam seu apoio, é honrosa para nós, e indicadora da irritação que produz, em meio dominado pela subversão, o exemplo de um grande País que soube repelir, e com a ajuda de Deus há de varrer a onda anarquista e comunista que devasta a civilização e ousa querer destruir a Igreja de Cristo.


TUDO isto sem falar na Revolução anarco-comunista que se avoluma. Amigos chegados recentemente de Paris resumiram nestas palavras a aterradora impressão: "cheiro que lembra o nosso março de 1964". Resta saber o que fará "l'armée française", mas os mesmos observadores dizem que, graças ao glorioso governo da "Place de l'Etoile, l'armée française n'eyiste plus".

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